Tempo para respirar: maio 2008 Arquivo

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Sem contar algumas salas de cinema perdidas por aí, não se pode dizer que Coffe and Cigarettes, (2003) do diretor Jim Jarmusch, tenha tido uma estréia de impacto no Brasil. Nem poderia. O propósito maior nem seria o de chamar público ou mesmo manter o espectador mudo perante a tela. Curiosamente, aquele que gosta de matar tempo com pequenos atrativos é que se identifica com estas onze cenas em preto e branco filmadas durante 17 anos as quais, em grande parte, estão no Youtube. Com um elenco vasto e de peso, que vai de Roberto Benigni a Iggy Pop, e de Alberto Molina a Cate Blanchett, o propósito da película não é tão grandioso: simplesmente sentar, fumar um cigarro e tomar um cafezinho o que, no final das contas, significa dar um tempo. E não se trata de rever a vida ou divagar sobre a identidade pessoal, mas simplesmente dar um tempo no sentido mais popular do termo. Um coffee break mesmo. No entanto, por mais que se pudesse considerar este filme como um basta para a produção, pressa ou besteirol, o que parece mais evidente é que o espectador assiste a tais cenas com uma certa nostalgia, o que é muito mais sintomático da morte do ócio do que seria recriminá-lo. Em tempos de "guerra contra o tabaco", simples atitudes como fumar no sossego, mais do que ir contra a maré sanitária, possibilita um estranhamento com a própria ação e, por mais que não haja assunto, não se pode negar que sentar para tomar um cafezinho sempre é um bom pretexto para estar em companhia. Sem compromisso.

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O verdadeiro sentido da urgência não está, como sempre se trata, de fazer um improviso às pressas para adequar a coisa ao tempo e ao espaço. Salvar por salvar. Diante da impossibilidade de crítica, uma vez que ela pressupõe o extinto campo experiência, sobra o isolamento para a análise bioquímica.

O tóxico já não é doença. Temos antídotos para o tóxico e também para os efeitos colaterais destes mesmos antídotos. Já não discernimos mais o que é tóxico. Além disso, tudo aparenta ser saudável para os felizes e virulento aos pessimistas. Contudo, as vacinas são tantas que tudo é uniforme em uma massa que nada diz. E o saudável já não se conflitua com o contagioso.

Já que não temos mais o Limbo para julgar as coisas apenas por seus atos, quem sabe seja interessante, em vez de matar todo o rebanho, isolar os elementos e pensar longamente em cima deles, para ver os que são fortes e, para os bichos fracos, deixemo-los aproveitar tranqüilos seus últimos momentos antes do perecimento ocasionado pelo isolamento da quarentena.

Pode-se, quem sabe assim, sanar aquilo que ainda vale para dar a ele um sentido antes original do que convencional.