... e não é preciso nenhum olho pra ver isso. A decisão de Adriano de parar de jogar não pode ser entendida de modo simplista como sintoma de uma patologia (isso para não falar da violenta grosseria de quem vê como mimado ou covarde o Imperador - a tão progressista Soninha acaba de dizer, no Bate-Bola da ESPN, que um trabalhador comum não pode abandonar o emprego sem dar satisfação). Isto é tentar normalizar a sua atitude, sem questionar o sistema contra a qual ela é dirigida. Adriano não deixa de jogar futebol. Ele continua jogando ao não jogar, driblando o rapto que capturara toda a sua potencialidade. É preciso tomar as suas declarações a sério e literalmente: a indústria do futebol seqüestrou o que lhe prometera, a felicidade. Só os verdadeiros jogadores podem parar de jogar e nisso manter toda a sua potência de jogar: "Só uma potência que tanto pode a potência como a impotência é, então, a potência suprema. (...) Face à habilidade, que simplesmente nega e abandona a própria potência de não tocar [jogar], a maestria conserva e exerce no ato não a sua potência de tocar [jogar] (é esta a posição da ironia, que afirma a superioridade da potência positiva sobre o ato), mas a de não tocar [jogar]" (G. Agamben). O gesto de Adriano (não importa que inconscientemente) de preferir não continuar a jogar é uma tentativa crítica de sustar a maníaca e incessante conversão de sua maestria em espetáculo ordenado, de acertar as contas com a sua própria potência de jogar (de lidar com o acaso, espaço, por excelência, da ética) - i.e., de tornar possível o acontecimento, sempre casual, da felicidade.
Há algo de podre no reino do futebol ...
Categorias:
2 Comentários
Alexandre Nodari
é doutorando em Teoria Literária (no CPGL/UFSC), sob a orientação de Raúl Antelo; bolsista do CNPq. Desenvolve pesquisa sobre o conceito de censura.
Editor do SOPRO.
Currículo Lattes
Editor do SOPRO.
Currículo Lattes
Alguns textos
"a posse contra a propriedade" (dissertação de mestrado)
O pensamento do fim
(Em: O comum e a experiência da linguagem)
O perjúrio absoluto
(Sobre a universalidade da Antropofagia)
"o Brasil é um grilo de seis milhões de quilômetros talhado em Tordesilhas":
notas sobre o Direito Antropofágico
A censura já não precisa mais de si mesma:
entrevista ao jornal literário urtiga!
Grilar o improfanável:
o estado de exceção e a poética antropofágica
"Modernismo obnubilado:
Araripe Jr. precursor da Antropofagia
O que as datilógrafas liam enquanto seus escrivães escreviam
a História da Filha do Rei, de Oswald de Andrade
Um antropófago em Hollywood:
Oswald espectador de Valentino
Bartleby e a paixão da apatia
O que é um bandido?
(Sobre o plebiscito do desarmamento)
A alegria da decepção
(Resenha de A prova dos nove)
...nada é acidental
(Resenha de quando todos os acidentes acontecem)
Entrevista com Raúl Antelo
O pensamento do fim
(Em: O comum e a experiência da linguagem)
O perjúrio absoluto
(Sobre a universalidade da Antropofagia)
"o Brasil é um grilo de seis milhões de quilômetros talhado em Tordesilhas":
notas sobre o Direito Antropofágico
A censura já não precisa mais de si mesma:
entrevista ao jornal literário urtiga!
Grilar o improfanável:
o estado de exceção e a poética antropofágica
"Modernismo obnubilado:
Araripe Jr. precursor da Antropofagia
O que as datilógrafas liam enquanto seus escrivães escreviam
a História da Filha do Rei, de Oswald de Andrade
Um antropófago em Hollywood:
Oswald espectador de Valentino
Bartleby e a paixão da apatia
O que é um bandido?
(Sobre o plebiscito do desarmamento)
A alegria da decepção
(Resenha de A prova dos nove)
...nada é acidental
(Resenha de quando todos os acidentes acontecem)
Entrevista com Raúl Antelo
Work-in-progress
O que é o terror?
A invenção do inimigo:
terrorismo e democracia
Censura, um paradigma
Perjúrio: o seqüestro dos significantes na teoria da ação comunicativa
Para além dos direitos autorais
Arte, política e censura
Censura, arte e política
Catão e Platão:
poetas, filósofos, censores
A invenção do inimigo:
terrorismo e democracia
Censura, um paradigma
Perjúrio: o seqüestro dos significantes na teoria da ação comunicativa
Para além dos direitos autorais
Arte, política e censura
Censura, arte e política
Catão e Platão:
poetas, filósofos, censores
Bibliotecas livres:
Visito:
mundo-abrigo
O Biscoito Fino e a Massa
Na prática a teoria é outra
A Navalha de Dali
O Descurvo
João Villaverde
Vistos e Escritos
Linkillo
Notícias de três linhas
Às moscas
O palco e o mundo
Quadrado dos loucos
El espíritu de los cínicos
grammateion
O Ingovernável
incinerrante.com
Dispersões, Delírios e Divagações
Flanagens
Blog do Bruno
Literatura, Cinema e outros bordéis
blogue do brüggemann
Blog do Juca
O Biscoito Fino e a Massa
Na prática a teoria é outra
A Navalha de Dali
O Descurvo
João Villaverde
Vistos e Escritos
Linkillo
Notícias de três linhas
Às moscas
O palco e o mundo
Quadrado dos loucos
El espíritu de los cínicos
grammateion
O Ingovernável
incinerrante.com
Dispersões, Delírios e Divagações
Flanagens
Blog do Bruno
Literatura, Cinema e outros bordéis
blogue do brüggemann
Blog do Juca
Comentários recentes
- Rodrigo Cássio comentou no post Há algo de podre no reino do futebol ...: Olá, Alexandre. Que belo post. Eu pensei os mesmos problemas desde o momento em que soube da desistência de Adriano. Bom ter lido aqui uma opinião semelhante à minha, pois não a tinha encontrado, até agora. Um abraço.
- Raphael comentou no post Há algo de podre no reino do futebol ...: Nodari, você está querendo dizer que o Adriano foi "tragado" pela indústria do futebol? Esse parece ser o meu entendimento...Como um esporte-espetáculo que gera cada vez mais e mais dinheiro, ele deixa um espaço pequenininho para uma dita espontaneidade, devendo todos os seus jogadores, técnicos e todos os outros seguir um roteirinho programado, ai
Busca
Categorias
- A metafísica sutil da jurisprudência (1)
- Censura: um work-in-progress (8)
- Clube de leituras (6)
- Dia do Juízo (6)
- Dicionário de Bolso (6)
- Drops (79)
- Eleitoreiras (5)
- Enciclopédia Consensual Ilustrada (2)
- Estados das Artes (11)
- Fragmentos da vida lesada (2)
- Frases Feitas (17)
- Intervenções (55)
- Memórias sentimentais (2)
- Ready-mades do Espetáculo triunfante (2)
- Resenhas (5)
- Vocabulário de política contemporânea (1)
Arquivo
- março 2012 (2)
- outubro 2011 (1)
- agosto 2011 (2)
- julho 2011 (4)
- junho 2011 (4)
- maio 2011 (2)
- abril 2011 (1)
- março 2011 (1)
- fevereiro 2011 (3)
- janeiro 2011 (2)
- dezembro 2010 (1)
- novembro 2010 (8)
- outubro 2010 (7)
- setembro 2010 (10)
- agosto 2010 (8)
- julho 2010 (2)
- junho 2010 (1)
- maio 2010 (5)
- abril 2010 (2)
- março 2010 (8)
- fevereiro 2010 (3)
- janeiro 2010 (4)
- dezembro 2009 (9)
- outubro 2009 (2)
- setembro 2009 (10)
- agosto 2009 (12)
- julho 2009 (21)
- junho 2009 (8)
- maio 2009 (11)
- abril 2009 (9)
- março 2009 (11)
- fevereiro 2009 (6)
- janeiro 2009 (1)
- agosto 2008 (1)
- julho 2008 (3)
- junho 2008 (5)
- maio 2008 (14)
Nodari, você está querendo dizer que o Adriano foi "tragado" pela indústria do futebol? Esse parece ser o meu entendimento...Como um esporte-espetáculo que gera cada vez mais e mais dinheiro, ele deixa um espaço pequenininho para uma dita espontaneidade, devendo todos os seus jogadores, técnicos e todos os outros seguir um roteirinho programado, ainda mais aqueles que saem do Brasil, que para boa parte da imprensa devem "europeizar-se", nun sentido de trajetória robótica (surgem no Brasil, ganham uns bons trocados aqui, vão pra Europa, viram "bacanas", juntam uma grana boa e encerram a carreira no auge - da bola ou do dinheiro). É aquela frase meio piegas: "Dinheiro não compra felicidade". Adriano bem que gostaria poder aliar a grana que ele ganha e a convivência com os seus, com a sua realidade e com as coisas que realmente gosta de fazer. Claro que não tem nada a ver com coisas que eu venho lendo por aí: "Ele não sabe o que fazer com tanto dinheiro" - ou a pior delas: "por ser da favela, não teve estrutura para lidar com isso" (como se as pessoas da favela tivessem "alergia" a riqueza). Entendo simplesmente a vontade de Adriano de parar como uma vontade de estar perto de quem gosta e aonde gosta de ir e ficar. Espero que ele fique no Rio de Janeiro e vá jogar no Flamengo...Nunca antes neste país um jogador se sentirá tão feliz!!! Abraços!
Olá, Alexandre. Que belo post. Eu pensei os mesmos problemas desde o momento em que soube da desistência de Adriano. Bom ter lido aqui uma opinião semelhante à minha, pois não a tinha encontrado, até agora. Um abraço.